segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Gotta Get Out Tonight

            Lá pelo quinto cigarro da noite, resolvi sair. Não sair do bar – na verdade, já havia muito tempo em que o havia deixado – , sair de casa mesmo. Havia me fechado lá como num casulo, dedilhando a guitarra incansavelmente até que, num ímpeto de raiva, chutei o amplificador e gritei com todas as minhas forças. Já não tinha mais ar nos pulmões e ainda gritava.
Estava irada. Irada de tristeza, devido a tristeza, a raiva que me inflamava o peito. Então gritei de novo e de novo até que acabasse por atirar a guitarra sobre a cama e andasse pelo quarto freneticamente, as mãos escorregando pelo rosto como se pudesse achar, na própria pele, a resposta.
Mas sabia que a resposta não se encontrava lá, se encontrava longe. Acendi mais um cigarro, sem nem mesmo olhar para o zippo que tanto amava. Podia me olhar no espelho, mas jamais veria o que me fazia falta. Via somente um reflexo de uma sombra negra que veio do Outro Mundo para este sem propósito, sem sonhos, porque o que fazia falta estava além.
Tinhas duas escolhas: Jack Daniels ou a colina. Jack me parecia mais acessível e confortável, porque ele, ao contrário da maioria que conheço, jamais me trairia. Jack seria também a escolha covarde.
E eu odeio pessoas covardes.
Enfiei o cigarro na boca e peguei a jaqueta, dominada pelo êxtase que há pouco me fizera querer arrancar os olhos. Ainda estava calçando as botas que havia saído mais cedo, e jurei por minha própria vida que se alguém aparecesse na frente iria levar um chute no meio das fuças.
Ouvi o ronco do motor e acelerei a moto. Acelerei até não ser mais seguro, até que se uma pedra sequer batesse na roda eu fosse arremessada estrada a fora. Voava sobre a máquina. Era a melhor sensação do mundo.
Fechei os olhos, sentindo o vento bater no rosto e então meu coração se acalmou. O vento sabiamente o puxou para trás, freiando-o antes que rompesse meu peito para fazer alguma loucura. Pensei no que houve, no que aconteceria. Se não houvesse mais o que acontecer, eu faria com que houvesse. Não ligava, só consertaria tudo.
A estrada do pé da colina se aproximou e, já com os olhos abertos, adentrei pelas curvas estreitas e escuras. Em dois minutos me encontrava no topo, e pude ver faróis acesos. Desmontei e andei, em silêncio, até as luzes. Sabia que estaria lá.
- Então... – comecei, tentada a acender outro cigarro, mas não gostava – e não gosto – de me apegar a coisas do tipo quando precisava de coragem – Vai me perdoar ou não?
Ela se virou, a expressão ilegível. Eu poderia nadar por aqueles olhos verdes, sem o menor problema pelo resto da minha vida.
- Deveria? Você sabe o que fez, Thalita.
- Você também sabe. E isso nos leva o que? O que foi feito está feito, Natasha – Por incrível que pareça, naquela hora estava calma. Só queria conversar e resolver tudo. Meu coração palpitava, mas tomei cuidado em mantê-lo em silêncio.
Ela não respondeu. Eu sabia que milhões de coisas rodeavam sua mente. Era engraçado que seu coração e seu cérebro dividiam opiniões opostas. Pude ver, através da escuridão, seu coração se encolher e gritar, assim como eu.
- Nesse momento, meu maior desejo é te esganar. – Confessou, se entregando aos poucos a raiva – até que minhas mãos não tenham mais forças.
Refleti um pouco, abrindo um sorriso tímido de canto.
- Pode esganar. Se me perdoar – Estava apelando, tudo o que queria ver era o sorriso se espalhar pelo rosto dela. Mas não veio um sorriso, só um suspiro cansado.
- Não agüento mais isso. Você. Essas coisas. Estou cheia de tudo – Tenho a absoluta certeza de que ela não queria confessar seus pensamentos a mim, mas como era a única pessoa num raio de 2km, dividiu comigo. Senti o peito doer e refreei as lágrimas. Bem tinha minha culpa no cartório e não podia questionar atitude tão cabível.
- Me deixe ajudá-la a tentar... A gente pode refazer tudo juntas – Me aproximei, ficando apenas a um palmo de diferença de Natasha. Toquei-a no rosto. Ela fechou os olhos, suspirando.
- Eu não consigo ficar longe de você – Ela riu, num misto de raiva e graça de si mesma – Apesar de tudo.
Sorri também, e a beijei nos lábios.
- Se em algum momento eu já pude viver sem você, pode ter certeza de que na hora não era eu – Ela riu, dessa vez sem raiva, e retribuiu o beijo.
Uma briga feia que quase nos levou ao abismo da separação. Quantas mais haveríamos de ter? Não posso dizer. Mesmo agora não faço a menor idéia, só sei de uma única coisa:
Jamais, em toda vida, nos separaremos de verdade. O destino é inexorável, mas quem o escolhe sou eu.

"Sick at heart and lonely
Deep in dark despair
Thinking one thought only
Where is she, tell me where"

3 comentários:

  1. Eu ia reclamar que você não escrevia há um bom tempo, mas nem deu tempo lol. Ficou muito bem escrito, como sempre.

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  2. Agora posso reclamar, haha. Comassim mais de um mês sem postar, Isa?! E eu que fico culpada quando fico uma semana sem passar por meu blog... Vê se escreve, menina.
    Ah, e dá uma passada pelo meu blog de vez em quando. Gosto de críticas construtivas e sinceras.

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