Escondi-me atrás da pilastra, cuidando para não respirar ou sequer mover um músculo para longe do cimento; temia que Christine espichasse os olhos ao mínimo ruído e, esperta como era acabasse por descobrir meu esconderijo.
Fugia e a perseguia, perdido no emaranhado de fios castanhos que, assim como eu a seguiam de perto; quando parasse de dançar, eles cobririam (quase) todo seu rosto - salvo o sorriso - e eu, no infortúnio de não ter nascido seus cabelos, ficaria mais uma vez a vê-la de longe.
Confesso que duas ou três vezes permitiu-me em sua casa, ao passo em que todos os dias me agraciava com o sorriso e os olhos firmemente presos aos meus, sem jamais tomar em mãos um único fio de cabelo que não fosse dela. Não me entenda como mal agradecido, querido leitor: sempre soube reconhecer a sorte quando esta convidava-me para sentar a sala de jantar em companhia da família. Ah, amizade de vizinhos! Naquela época não era sinônimo de namorados, era apenas... Amizade. Sim, a amizade que não se vê mais por estes dias! Amigos durante a vida toda sem jamais trocar um único beijo, um mero roçar de mãos...
Continuei atrás dela, correndo sobre as pontas dos pés. Aquela pequena dançarina jamais parava quieta num só lugar - tinha formigas nos pés! Estava sempre correndo como se pisasse nas estrelas, os braços em movimento junto a corpo e os olhos luminosos de incontestável ternura possuídores de poder místico que hipnotizavam até o mais fortes dos homens.
A juventude sempre a pregar peças amorosas... Um dia a amava, pois então no outro amava a vizinha do lado e assim por diante até o final da rua. Naquele dia era dela e jamais pensei que ainda seria.
Sem mais nem menos, Christine parou. Suspeitei que houvesse me descoberto, mas não - ela apenas desatou o nó da fita sobre os cabelos e os balançou para lá e para cá para recomeçar seus passos ritmados de novo sem lançar um único olhar para trás. Cachos! Um mar deles descendo até o meio das costas em perfeita simetria com o balanço dos quadris e a silhueta formosa de uma jovem ninfa cujo sorriso promove até mesmo a paz entre os mundos.
De todas as garotas da rua, apenas dela foi meu coração. Não importando quantos corpos esbeltos e sorrisos ofuscantes me aparecessem, nenhuma conseguia comparar-se a beleza de um dedo dela. Christine era antes de bela, boa. Encantada com a magia da meninice, pouco se deixou corromper pelas malícias de outros rapazes até que eu a alcançasse.
E alcancei. Com o vento no rosto, meu desesperado caminho chegou ao fim. Antes que pudesse afastar os pensamentos de como era ofensivo haver uma garota como aquela perambulando por aí, vi-me cara a cara com ela. Christine trazia um sorriso travesso os lábios e cabelos espalhados em volta do rosto, olhando-me como se tivesse acabado de me pegar num momento inúmeras vezes mais contrangedor do que realmente era.
Sorri ao vê-la rir de minha inquietação. Algumas tentativas de um pedido falso de desculpas foram totalmente inúteis. Não que ela houvesse se importado, mas acho válido comentar que ao menos tentei parecer arrependido. Na verdade, ouso dizer que a castanha gostou de me ver tão enlouquecidamente apaixonado por ela a ponto de poder ser expulso de sua casa apenas para vê-la entrar no quarto.
Christine então pegou-me pelas mãos e caminhou lentamente até o quarto, guiando-me com dedos entrelaçados junto aos meus.
- Tem algo que quero lhe entregar. - Sussurrou ela, ainda no mesmo tom travesso.
Fechou-se no quarto comigo e pôs em minhas mãos um lenço que vira outras vezes sobre a penteadeira, dizendo:
- Este é meu coração, cuide dele com sua vida.
Postar um Comentário? Eu teria deixado ali: Digam "owwwn":
ResponderExcluirOWWWNN *--* Que lindo, honey *-----*