segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Mas onde foi que eu errei?


            Segunda-feira á tarde, centro fervilhando de gente, um calor de matar. A mãe arrastava o filho pelo braço, resmungando sobre as amenidades e injustiças do cidadão de bem, alheia a história que o menino contava sobre uma aventura na escola, e como seria bom ter passeios nos bosques todos os dias. Quando disse que queria virar explorador um dia, ela parou, soltou-o e o olhou carrancuda. Em seguida se abaixou, repuxou os lábios, e disse em desaprovação:
            - Que explorador o que, menino! Isso é coisa de vagabundo, você tem que trabalhar com alguma coisa de verdade!
            O menino baixou os olhos e ficou com aquilo na cabeça por todo caminho até a casa.
            Em outra tarde, foram à feira. Depois de comprar alfaces e cebolas, o menino fez as contas e viu que o moço tinha que devolver cinco reais, mas na verdade devolveu seis e a mãe guardou do mesmo jeito, ainda que tenha lhe puxado a saia e avisado depois. Porém, não perguntou, porque ela sempre dizia que “um real não tem problema”, ou algo que acalmasse igualmente a consciência.
            Em casa não era diferente. O pai era o tipo de homem que achava que a  mulher tinha que cuidar dos filhos, fazer todo o serviço de casa e ainda deixar a janta pronta na mesa para quando chegasse, e ai se não o fizesse. Ele também, tinha que se comportar como homem. A única vez que se aproximou de uma boneca, Deus do céu, tomou uma surra tão grande que chegou a ficar com o traseiro inchado por dias. Umas cervejinhas a noite para acalmar todo o estresse do trabalho e igreja aos domingos, para construir a moral da família cristã em prol do pós-vida.
            Acabou que o menino virou um adolescente amargurado, enraivecido. Quis virar pintor, mas era escurraçado, puxado para trás. E quando fez amizade com um colega que era preto e gay? “Não é que eu tenha preconceito, mas...”, a mãe dizia. O pai culpava o teatro, o vídeo-game, a televisão... Nem os livros escapavam. Ele era um vagabundo, que não prestava para nada, e se envolvia com gente da pior espécie. Um desperdício. Ter um filho desse tipo não valia a pena, apenas decepções. E depois de tudo que haviam feito!
            Anos depois de ter virado adulto, os pais não entenderam quando receberam a notícia. Ir a Corte? Eles? Uma família exemplo? Um absurdo. Quando foram, e ouviram que o filho estava sendo acusado de espancar a mulher, dirigir alcoolizado, racismo, homofobia e agora, ainda por cima, roubar, a mãe se virou em prantos para o pai e encostou em seu ombro.
            - Onde foi que eu errei ao criar esse menino, meu deus do céu?
            Ao que o pai respondeu:
            - Esse menino já nasceu assim. Tem gente que não tem jeito, já nasce ruim, e é isso que a gente recebe!  

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